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Curadorias em rede: PÓLVORA


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Ficha técnica: Objetos deslocados, 2016, Cristiane Reis: série de cartões-postais personalizados. Efeito dominó, 2018, Kika Carvalho: escultura, instalação e performance. Arquitetura do Improviso, 2016, Tete Rocha: série fotográfica.

PÓLVORA

por Michele Medina


Dada a realidade de um país que atravessa um projeto obscurantista, que é posto em prática de maneira radical, promovendo o desmantelamento da Cultura e das produções artísticas, das quais as consequências podemos observar no cotidiano, se faz necessário que assim como o espaço público, o virtual também seja retomado como local para a discussão e atividade politizadora.


Baseado na diferença partilhada nos espaços e diante do cenário político desastroso, que

ganha ares de tragédia com a pandemia da Covid-19, pretende-se com o projeto PÓLVORA

ocupar criticamente a virtualidade, visando seu amplo alcance e explorando as suas

possibilidades. Para promover o diálogo entre as urgências da sociedade e poéticas artísticas, apresentamos trabalhos das artistas: Cristiane Reis, Kika Carvalho e Tete Rocha.


Em suas obras, as artistas exploram temas que expõem feridas abertas e pulsantes no campo das relações humanas. Em diálogo com o espectador, proporcionam leituras de mundo que permeiam seu local de vivência e desnudam absurdos cotidianos que são naturalizadas no espaço social. Exemplos dessa relação, são as obras Objetos deslocados, Efeito Dominó e Arquitetura do Improviso, das respectivas artistas.


Em Objetos Deslocados (2016-2018), apresentada de forma despretensiosa como alguns

cartões-postais com objetos comuns estampados em sua imagem principal, Cristiane Reis

materializa casos de violência contra a mulher no verso dos cartões, que ocorreram no Espírito Santo. Os objetos presentes nas imagens são deslocados de sua função primária e realocados pelo agente da ação como arma para agredir e, até mesmo, matar mulheres. Ao utilizar cartões-postais como suporte artístico em um Estado conhecido por suas belas paisagens, a artista retira o espectador de um lugar idílico e o confronta com a realidade: a violência de gênero, em especial quando cometida contra identidades femininas, é uma problemática endêmica no Espírito Santo. Apesar dos esforços do Governo, o Estado ocupa as primeiras posições em feminicídio, com uma taxa de morte por gênero três vezes maior que a nacional.


Promover reflexões sobre a realidade também está presente na poética de Kika Carvalho.

Conhecida por suas intervenções urbanas que tratam da violência contra mulher, em sua obra Efeito Dominó (2018), a artista leva para o espaço expositivo uma performance/instalação que aborda o aniquilamento de corpos pretos e as violências sofridas por essas mulheres. Na proposta, 60 peças em cerâmica com formato feminino são espalhadas pela artista formando uma espécie de tabuleiro de dominó. A instalação foi exibida na exposição Malungas que aconteceu no Museu Capixaba do Negro Verônica Pas (MUCANE) em 2018. No dia da abertura, a artista realizou uma ação em que, a partir de uma característica do local, as peças caem, sobrando apenas as figuras despedaçadas, quebradas no espaço.


Ao se apropriar de elementos que compõe o espaço, Tete Rocha trabalha questões importantes do urbano: as moradias temporárias de pessoas em situação de rua. Em

Arquitetura do Improviso (2016), traz uma série de fotografias com as mais variadas moradias provisórias que encontra pela cidade. Os registros resultam em uma discussão urgente sobre a precariedade e marginalidade a que pessoas são submetidas pelo sistema capitalista, mexendo com a percepção do passante com o seu redor, tornando visível o que, por muitas vezes, se tenta invisibilizar.


Assim como o material que dá nome ao projeto, inflamável e explosivo, entende-se assim também a situação atual do país, portanto, quando se fala de uma “nova sociedade pós-

pandemia”, pra quem se fala? Ainda é preciso encarar a vulnerabilidade que se impõem as minorias políticas, abandonadas pelo Estado nas garantias de seus direitos. PÓLVORA, atenta a isso, pretende trazer os temas ao público, visando criar não apenas um observador de arte, mas também um público ativo e questionador, através da visibilidade que dá a essas questões, buscando um debate sério e politizador da realidade.


Esta curadoria é parte da pesquisa de iniciação científica “Processos de criação de

curadorias contextuais em Vitória (ES)” realizada em 2018/2019 com apoio de bolsa UFES.


Michele Medina

Graduanda em Artes Plásticas pela Universidade Federal do Espírito Santo, pesquisadora de

Processos de criação artístico-curatoriais. Realiza pesquisas em curadorias contextuais e

História das Exposições em Vitória (ES). Bolsista PIIC/UFES 2018/2019 e 2019/2020.

Conselheira, representante da Câmara Cultural de Arte Contemporânea, no Conselho

Municipal de Política Cultural de Cariacica (ES) para o biênio 2019/2021.


Minibio das artistas:


Cristiane Reis

Artista visual e educadora. Graduada em Artes Visuais pela Universidade Federal do Espírito

Santo. A artista utiliza imagens autorais ou apropriações para compor seus trabalhos ligados à denúncia das violências cometidas contra a mulher, principalmente, no ambiente doméstico.


Kika Carvalho

Artista visual, educadora social e grafiteira. Graduada em Artes Visuais pela Universidade

Federal do Espírito Santo. Atua no movimento hip hop desde 2009, quando iniciou no graffiti. É componente do Coletivo DasMina e Coletivo Femenina. Além da produção de pinturas de murais, possui trabalhos com pintura, gravura, escultura e vídeo.


Tete Rocha

Artista visual e produtora cultural. Graduada em Artes Plásticas pela Universidade Federal do Espírito Santo e Especialista em Gestão Cultural pelo Centro Universitário Senac de São

Paulo. Se considera ativista daquilo que chama de “poética da relação”: acredita na interação e no diálogo como agentes importantes de transformação das ideias, das pessoas e da arte.

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